domingo, 24 de agosto de 2008

Crónica 4

Uma questão de solidariedade


Há uns bons anos atrás, era comum uma pessoa saudar outra que encontrasse a passear na montanha. Era quase um alivio encontrar alguem mais e saber que não estávamos completamente sós e incomunicaveis, naquelas paragens reconditas (pensar que os telemóveis não estavam tão difundidos e que os caminhos de acesso eram lentos). Hoje em dia, o fenómeno adquiriu umas proporções tais que gera situações, no minimo, hilariantes!

Com a facilidade de acessos e com a facilidade de comunicação, uma pessoa que vá passear na montanha, quase não se sente verdadeiramente só. E quem quer procurar um pouco de solidão tem que se embrenhar bem na montanha, para longe de caminhos marcados, pois já aparece gente em todo o lado. O curioso é que a velha saudação na montanha se manteve, ainda que ao cruzarmo-nos com outra pessoa, já não sintamos aquela sensação de alivio, porque sabemos que estamos mais perto da ‘civilização’, estamos mais comunicáveis e, atrás desta pessoa vêm, provávelmente, muitas mais …

Recentemente estive em Andorra e entrei por uns caminhos de montanha que conduziam a uns lagos escondidos … Por estes caminhos que mal chegavam ao quilómetro, cruzei-me com várias pessoas e todas me saudavam … Comecei a suspeitar ! Espera lá, mas ali em baixo no parque de estacionamento não me saudaste ! porque é que me estás a saudar agora ? Eu venho para este lugar bonito à procura de um pouco de calma e distância dos aglomerados populacionais … e, na verdade, dispenso este tipo de saudação que não tem nenhum significado. Estou certo de que se a mesma pessoa me visse a pedir boleia 20 minutos mais tarde, passaria por mim sem se incomodar … Então concluí: esta saudação é apenas um resquício de um hábito antigo e util. Mas hoje em dia, em lugares por onde passam dezenas de pessaos, não tem qualquer utilidade e parece até descabido, para não dizer irritante.

Fez-me recordar uma primeira viagem de mota que fiz em direcção à Suiça: em Espanha respondi à saudação das poucas motas com que me cruzei … em França passava a vida com a mão esquerda levantada, pois os motards eram às centenas !!! Deixei de levantar a mão ! Conclui que não gosto desta saudação classissista … Então e se eu estivesse a viajar numa Zundapp ou Famel 50, aqueles motards em motas potentes tambem me dirigiriam uma saudação ?!? Creio que não !

Hoje, banalizaram-se os passeios na montanha, quase tanto como a condução de motos potentes. A solidariedade é das atitudes humanas que mais me comove, mas a solidariedade de classe, em ‘classes’ tão abrangentes perde o seu sentido, pois a mensagem que estamos a enviar transforma-se em algo estranho como “sou solidário contigo e com os outros 500 mil iguais a nós …”. Sendo assim, não será muito melhor assumir a solidariedade como uma atitude intrinseca das pessoas e ser soldário com toda a gente, independentemente da ‘classe’ ?!?


Por falar em solidariedade, dê uma vista de olhos nos seguintes projectos de que faço parte, em:

http://icecare.blogspot.com

http://travessiaoceanica.blogspot.com